segunda-feira, 31 de maio de 2010

A alegria da bicharada IV

-Escoltam-no ao castelo,
Ouve-se algures na praça apinhada.
Os súbditos do reino da bicharada
Observavam a escolta, comitiva e aparato
Que ao mocho tinham zelo.
-Libertem-no, deixem-no ir - continuava
Alguém incógnito, no anonimato,
Escondido entre a multidão.
As tropas do porco, o rei daquela gente
Confiscavam os haveres da ave:
Livros, ferramentas, incluindo um velho pião,
Retortas, um alambique, vários frascos,
Até garrafas de aguardente,
Também cadernos já velhos e gastos.
-Fazêmo-lo para o bem desta sociedade!
Declamava o porco num discurso inspirado,
Justificando a necessidade
De o levar preso e algemado
contra a sua vontade.
-Libertem-no, gente ignóbil!
O tumulto alevantava-se em tom de rebelião
Mas o exército bem armado,
Subitamente abafa a revolução.
O rei mandara preparar o quarto
Com a mais fina e delicada seda
Onde hospedar o velho mocho já cansado,
Preparando-lhe um jantar farto,
Numa grande e real mesa.
-Peço-te lealdade, velho amigo,
Que sempre me preocupei com o povo, contigo!
Nestas duas vezes o seu discurso inspirado
Não o levou a qualquer lado.
Responde o mocho apreensivo:
-Muito cuidado com o seu uso,
Pois voltar a trás, pode já ser tarde
Quando cai nas mãos do abuso
Tão antiga e nobre arte.
Farei o que me pedis, real senhor,
Mas aviso-o que, se em diante, não trouxer amor,
Só nos trará perdição.
- Isso não sei - resmunga o rei
- É para o bem desta grande nação.

Sem comentários: