sábado, 1 de dezembro de 2007

Eférmero anacoreta

Estrincho com palavras em cima da mesa
Envolto numa estranha e pesarosa nébula.
Oiço o som púrpura de uma vela acesa.
Escrevo as palavras caladas
De uma jarra ao canto.
A luz da vela é trémula.
Ao longe vislumbro um sereno pranto
De algo que não é, mas que existe.
É algo que me parece triste.
E chora canções entoadas em vozes desafinadas.
Continuo a escrever sem saber o que dizer.
A senhora da moldura olha-me fixamente
E não sei o que me quer.
Rangem as tábuas do soalho
Como se misterioso vulto vagueie ao acaso
Sem ter onde se esconder.
Duas rosas murchas pendem de um vaso
Que está em cima da mesa.
É estridente o som da vela acesa.
Lá fora o gélido orvalho Silencia as criaturas da noite.
Sinto um calafrio ao ver a porta.
Queria sair daqui mas escrevo.
Sinto o acerbo toque de um açoite.
A cómoda está ligeiramente torta.
A parede da sala é áspera e o relevo
Molda uma estranha tertúlia de incógnitos animais.
O escuro silencia o fulgir da vela acesa.
Já não quero escrever mais...
Brilha a madrugada com um alarido de luz,
Já não preciso da vela acesa,
É mais um dia que me seduz,
Esqueço as palavras em cima da mesa.

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