sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

O fado da estrada

Saía de casa airoso e cantante
Com casaco vistoso numa cor gritante
O homem que para a morte corria
E nem sequer se apercebia.

Um sorriso se lhe rasgava na boca
Lembrando um menino matreiro.
De leve gesto, venerava com praza
De mansinho, quem passava no passeio.

Foi a injúria da sorte pouca
Que lhe trouxe sombrio fado.
Tivesse ele... ficado em casa!

Pois pereceu num sinistrado.
O homem para a morte correu
E nem sequer se apercebeu.

Sérgio O. Marques

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

O porco, o tolo e o covarde

Canga, o porco, o tolo
Com fingimento e tom alarde.
Logra, o porco, do tolo, o dolo
Em promover o covarde.
Vai à luta e quase morto,
Vê o tolo como dói.
No entanto, para o porco
O covarde é o herói.
Dá ao tolo um par de botas,
O porco que cheira a alho.
Para ao covarde ceder sotas,
Deixa o tolo num cangalho.
O vassalo, com panos quentes
Diz ao porco o que não é,
Sendo os parvos inocentes
Levados à falsa fé.
O néscio que o tolo era,
Em se fiar no covarde,
Cai em si, solta a fera,
Soca-os e escorraça-os.
Quando forem, já vão tarde.

Sérgio O. Marques

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Liberdade, Igualdade e Fraternidade

Somos diferentes na mesma essência,
No mesmo intento, na mesma carência,
Nos mesmos prantos, nos mesmos risos,
No mesmo desdém, na mesma complacência.
Somos o mesmo no que nos torna vivos.

Somos diferentes no mesmo coração,
Na mesma prece, na mesma oração
Na mesma ânsia, na mesma calma,
No mesmo desânimo e na mesma aspiração.
Somos o mesmo no que nos vai na alma.

Somos diferentes na mesma arte,
Na mesma música e em qualquer parte,
Na mesma filosofia e na mesma ciência.
Com alegria, fazer da paz nosso estandarte
É enaltecer da humanidade a sapiência.

Somos diferentes no mesmo porvir,
No mesmo amor que nos devia unir,
Na mesma igualdade, na mesma liberdade.
Somos o mesmo na virtude que o devir
Designará aos povos, a fraternidade.

sábado, 2 de fevereiro de 2008

Tudo, nada

Do nada se fez tudo,
Sem udo nem miúdo.
Flui o tudo como lada
E de tudo se faz nada.
O nada a nada sabe
Pois é nada em ser sabor.
Nem tudo no saber cabe,
Quem sabe isso é sabedor.
Enche o nada, o vazio
Replata-se de coisa alguma.
Ao tudo não se abate o brio,
Não lhe falta coisa nenhuma.
Ter tudo em não ser nada
É não ter nada, ser tudo.

Sérgio O. Marques

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

O sonho

Mergulho inconstante em lagos esféricos
Escorridos de mercúricos malmequeres
Respirando a água que não me afoga em séricos
Fios doirados de cetim em recantos édenes.

Voo, irmão do vento, perdido nas núvens
Galgando vertiginosa aceleração
Rejubilada do afecto de muitas mães.
Possuo o mundo na palma da minha mão.

Sou as árvores, sou a terra e os mares.
Sou os caminhos inundados de prazer.
Sou o sol que não teme em te acolher.

E ali estás tu, rútila de assombrar
Iluminando o dia, quando de súbito
Acordo para a vida, estava a sonhar.

Sérgio O. Marques