quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Amigas inseparáveis

Na cabeça enlaçado,
De um vermelho encarnado,
Um lindo laço de fita
Traz rapariga bonita
Dando-lhe um ar engraçado.

Cabelo, negro luzente,
Olhos, castanho brilhante,
Riso na boca contente,
A ataviar o semblante,
A sorrir p'ra toda a gente.

Consigo vem uma amiga,
Bela moçoila também
Onde vai uma, outra vai
Quando vem uma, outra vem,
Brejeiro retoque de intriga.

Uma é loira outra morena,
Tez queimada ao verão,
Camisa, saia pequena,
Trazem cada com seu tom
Uma malinha de mão.

Amigas inseparáveis,
Enquanto passeiam a avenida
Deixam memórias indeléveis
Em cantigas quase etéreas,
Belas melodias da vida.

Passeiam e passam na rua.
Enquanto lá vão sorridentes,
Levam nos semblantes contentes
Risos, nos lábios, luzentes
De um luzeiro azul lua.

Quem são? Perguntei pasmado
Com tão rútilo esplendor
Quando as vi mesmo ao meu lado.
Pareciam, num quadro pintado,
Antigas histórias de amor.

Era rubro o fim da tarde,
Um crepúsculo de arrebol.
O tom vermelho, cor da carne
E o grasnar das gaivotas alarde
Adivinhavam o pôr do sol.

Ao largo flutuava a traineira
Branca no cerúleo do mar.
Numa algazarra ligeira
Estavam ali mesmo na areia,
Duas crianças a brincar.

O cheiro a maresia era intenso,
Pairando no ar com ternura
Aromas de mirra e incenso.
A doce brisa de ternura
Esvoaçava-lhes os cabelos ao vento.

Senti o êxtase dum momento,
Efémero enlevo, voo de águia,
Duma sereia, encantamento,
Tão harmónico chamamento
Clamando por mim, ávida.

O tempo de repente parou,
O mundo deixou de girar,
O canto do oceâno cessou
Das ondas na costa a quebrar.
Quando as vi tudo mudou.

Seus corpos em vestes garridas
Vestiam o paladar dos meus olhos,
Encerravam contos e vidas,
Histórias há muito esquecidas
E jarros de rosas aos molhos.

O mel do orvalho de maresia
Adoçava-lhes cabelos sedosos,
No paladar de melodia
Dum sorriso de lábios garbosos
A transbordar alegria.

Cabelos negros e olhos castanhos
Faziam duma, maravilhosas delícias.
Doutra os olhos azuis, meigas carícias,
Forjavam no loiro doiros tamanhos.
Eram fonte de mil blandícias.

Delas me abeirei acanhado
Com o coração no peito demente
Como catadupa, desnorteado,
A bater inquieto, descontrolado
Esta paixão em mim ardente.

Digo-lhes em voz ténue e rouca
A sua beleza num quadro pintado
Na minha imaginação tão loquaz e louca
Que, sem jeito, em mim treslouca
A razão. Que sigo em passo desatinado.

Canto em serenata esta paixão
A desbravar-me o ser baldio
Como floresta, densa vegetação
Onde algures discorre o rio
Que leva em si esta emoção.

Uma olha-me, outra elegante
Contempla os versos deste meu canto,
Sorrindo entre si, grande era o espanto
Deste meu gesto raro e distante,
Deste meu modo fraco e quebranto.

Uma corada, outra a ruborescer
Qual ferro fundido numa fundição
Com risos marotos a florescer
Respondem sem uma graça qualquer.
Foram um manto de desilusão.

Lindas eram, não o posso negar,
Contornos de corpos admiráveis
Mas algo mais a destoar.
São ambas desagradáveis,
As amigas inseparáveis.

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