quinta-feira, 3 de junho de 2010

Numa rica e farta cidade

Numa rica e farta cidade
Deambula pobremente
Moribundo, sem vontade
Um mendigo, tristemente.

Na face pungida de dor
Surge, do corpo, sectante
O frio que o corta, o tremor,
Cada lágrima de gelo ardente.

O homem de lânguidos membros
Sentado à deriva da vida,
Não vê alegria. São lamentos,
Única companhia que lhe é devida.

Pede, em trémula voz penitente
O pedinte (cuja vida é penitência)
Esmola ao traseunte complacente
Na esperança de uma réstia de clemência.

E a cidade resplandecente
Ao sol e à luz da lua,
Apinhada com rica gente
E um pobre mendigo na rua.

-Ah! Vida infame! - Pensa
Enquanto, em pranto, a desgraça
Calunia com ira imensa
A sorte que lhe não pára e passa.

A tão esbelta cidade assiste
Ao pranto do homem na perdição
Duma vida tão dura e triste,
Dormindo ao relento na chão.

Onde errou? Qual vil fado
Impingiu tão duro castigo?
Quiçá, desventuras do passado
São injúrias que traz consigo.

Nos olhos as lágrimas são
Presença da melancolia constante
Do homem a quem a solidão
O abraçou de um destino errante.

Na cidade corre a multidão
Como um rio a correr p'ró mar
E um homem caído no chão
Sem se conseguir levantar.

O homem que nada tem
Está só, caído no chão,
Usurpado por alguém
Sem remorso ou coração.

Vive bem, na opulência,
Numa cidade de grande fausto
O autor da indigência
Do homem pobre exausto.

Outrora amigo, confidente
De segredos bem guardados,
Para ele é um pobre indigente,
Uma história do passado.

A gente que ao homem vê,
Vê ali um vagabundo
Não sabem o como ou porquê
Desceu aos confins do mundo.

Numa rica e farta cidade,
Cidade com rica gente,
Na penúria, sem vontade,
Vive um pobre indigente.

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