quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Um cinzento só

No século de setecentos talvez,
Ouvia o neto, o avô, seu saber
Num tempo que, no mundo eram só três,
Os pinheiros erguidos ao amanhecer.
Árvores raravam o cinzento da paisagem.
As pedras escuras, foscas, escurecidas
Pelo breu do consumo coravam a imagem
Do preto e branco das cores sumidas.
O verde há muito esqueceu o quadro
Azul do céu, melancolia enublada,
Choro ácido sobre o mar irado.
O constante silêncio é som de nada.
Dizia, então o velho, franzindo a fronte:
Há muitos anos atrás, não era assim.
Cobria, verdejante, um manto cada monte,
Cada planície, cada vale, numa cor sem fim.
Havia pássaros pipilantes, bailarinos
Voavam pelos ares, numa algazarra,
Festa de encantar dos pequenos paladinos
E os peixes no oceâno eram farra.
Os brilhantes raios de sol raiavam
Os límpidos areais banhados de sal
Macios, sedosos, fragrantes, emanavam
Fragrância a fresco e maresia jovial.
Deslumbrantes seres ornavam o planeta,
De vida de um equilíbrio quase perfeito,
Estrénuo movimento de solitário cometa,
Tão terno calor que nos aquecesse o peito.
O menino perscrutava atento e sonhava
O seu futuro. Do passado nada esperava,
Morto e enterrado nos livros de velha capa
Perdidos num reino que não vem no mapa.
Pergunta, sereno, com olhar apreensivo:
Que será de nós, aqui sozinhos, aqui sós?
Inspirou e expirou lentamente, meditativo
E numa pausa repetiu: Que será de nós?

Sérgio O. Marques

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