quarta-feira, 1 de abril de 2009

Agonia

De arrepiar os pêlos ao mar
Encantado aos olhos da lua
Acariciando uma pedra cinzenta
Macia como as pedras da rua
Por onde me deleito a andar.

De encrespar o pacato pinheiro
Tirando-lhe o chapéu de menta,
Fragrância do eucalipto que cheira
Veneando lentamente à beira,
Jovem, de tão velho sobreiro.

De enfuzinar o silêncio da calada
Savana enrolada no chão de cetim
Afagada em marcha lenta molhada
Do eflúvio cor-de-rosa tom carmim
A perfumar azul o céu, caiada.

De acirrar as calmas pastagens
Bailantes ao chocalho das aragens
Livres esvoaçadas no orvalho da manhã
Caído na pele, frescura forte e grã,
De olhos fechados a zunir miragens.

De dissolver a espuma do deserto
Solvência líquida soluta dissoluta
Duma lágrima a lavar o pranto abrupta
Uma face que já não ri e decerto
Enterrada produndamente em chão aberto.

De morder os tenros lábios da cara
Num beijo solto à quente brisa clara
Carícia dos choupos numa dança insana
Volvendo volúveis no seu leito, a cama
Alcochoada em penas de folha rara.

De efeverescer o sangue do quedo rochedo
Afuguentando o temor das barbas do medo
Saído da terra num dia de tempestade
Sob a chuva seca a enxugar a sã idade
Do ser no longínquo tempo tão só mas ledo.

De acelerar o passo da caneta do poeta
Escrevendo a fúria e a calma, vã quimera
Do sentido de existência carnal e repleta
Da paixão, aquele ouro que a vida esmera.
A agonia de viver enquanto a morte espera.

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